MINGAU DE AVEIA


MINGAU DE AVEIA – UM RESGATE DE MEMÓRIA DE QUASE 80 ANOS
2018 – 21 de maio – 20:30h
Fazendo mingau de aveia como refeição final do meu dia e o dia do Flavio. Dou uma melhorada com Baunilha.
A colher girando para regular a fervura, traz a memória fotográfica com detalhes.
Por volta de 1942 (ou 1941) até 1947. Tenho ao redor de 11 ou 12 anos. Estou no curso ginasial do Colégio Paulistano, na rua Taguá 150 – Liberdade.
Moro no Ipiranga, na rua Lucas Obes 511 (depois na mesma rua 642(??). Devo estar no 1º ou 2º ano ginasial e suponho que as aulas comecem às 8:00h. Devo sair de casa pelas 6:30h porque tomava o bonde a meio quarteirão de casa em direção ao Sacomã, e voltava no mesmo bonde para assegurar um lugar sentada. E o espaço percorrido pelo bonde 20 – FÁBRICA - era mais ou menos longo: Rua Silva Bueno, rua Thabor, Avenida Dom Pedro I, Rua da Independência passando pelo Laboratório Andrômaco com seu grande relógio onde se controlava o horário. (Às vezes devo ter perdido um bonde, mas não me lembro de ter chegado com atraso), Largo do Cambuci, Rua do Lavapés, rua da Glória, onde eu descia na esquina da rua São Joaquim.
Atravessava a rua e cobria a pé quase toda a rua São Joaquim (subidas e descidas) passando pelo Colégio Anglo Latino à esquerda, bem perto da rua da Glória, um cinema  do qual não lembro o nome, a sede da Maçonaria (loja importante), o ginásio o Estadual acho que Presidente Roosevelt .Chegava então à rua Taguá, à direita,  um quarteirão da rua  da Liberdade onde a rua São Joaquim terminava. O Colégio Paulistano ficava no meio do quarteirão à esquerda.
Fiz esse trajeto durante 7 anos.
Mas, porque o mingau de aveia?
Lembro em detalhe a casa em que nós morávamos, no nº 511 da rua Lucas Obes: porta abrindo diretamente na calçada e acho que tinha também uma janela para a rua porque o primeiro cômodo era uma sala quadrada. Uns degraus na porta porque tinha um porão (baixo, só de ventilação) onde uma vez morreu um gato. Da sala - que tinha um congoleum (*)uma mesa quadrada e uma cristaleira (que nos acompanhou durante muito tempo, com portas de cristal bisotado (*) mas não me lembro das cadeiras. Passava-se diretamente para o quarto de casal, então com uma cama de casal com estrado    de molinhas de metal e um colchão de palha (capim) arrumado através de aberturas para as mãos. Todos os dias. Passava-se então para um quartinho menor, cimentado, onde eu dormia.  Minha irmã Nelida dormia em um berço ao lado da cama de nossos pais até seus 5 anos quando morreu.  Ela tinha uma doença congênita e era muito frágil. Não devia brincar na rua como eu e por isso não tenho quase nenhuma lembrança dela.  Muito depois de sua morte, minha mãe descobriu acidentalmente, que ela tinha o que se chamou Doença Azul (ligação entre a artéria aorta e a veia cava que misturava o sangue arterial com o venoso, produzindo pouca oxigenação). A cozinha era um cômodo anexo e para se chegar a ela era preciso sair para fora.  No final do terreno ficava o banheiro em construção separada e uma espécie de barracão coberto onde ficava uma grande caixa de madeira onde se guardavam as “tralhas’ da casa.  E uma laranjeira.
Como a casa era a primeira de um correr de casas da rua, era parede e meia com a Padaria Globo, e ao lado do forno.  Daí a quantidade de baratas que corriam pela casa.  Também tivemos uma infestação de percevejos (*) e me lembro de minha mãe com uma chaleira de água quente lavando o estrado de molinhas.
Da porta do quarto se via uma grande escada e uma sala de aula (de dona Rosalina) do Grupo Escolar. Ela falava tão alto que se ouvia da minha casa.  Esse era o Primeiro Grupo Escolar do Sacomã (mais tarde Visconde de Itaúna com um prédio próprio e não uma casa adaptada). Nesse Grupo Escolar passei o 3º e 4º anos primários com uma mesma professora – Maria José Gallet (tenho fotos) Tinha então 8 e 9 anos. Aos 10 anos terminei o Primário e fui a única não só da família, mas da rua que continuei a estudar. De um modo geral as meninas ou iam para a Fábrica de Juta a meio quarteirão, como operárias, ou ficavam em casa como costureiras.
Depois de um exame de Admissão, aos 11 anos entrei para o 1º ano Ginasial do Colégio Paulistano.  E é aí que entra a AVEIA, o MINGAU DE AVEIA.
Como eu tinha que sair muito cedo para a escola, minha mãe cozinhava na véspera, à noite, aveia na água e deixava só para pôr o leite de manhã fazendo um mingau que eu tomava como café da manhã.  E saia bem alimentada.  Em que fase colocaria o açúcar?
(Não consigo me lembrar se eu levava algum lanche porque saindo da escola por volta de meio dia, só chegava em casa pela 13:00h. Impossível ficar 5 horas e meia sem comer nada).
Então, a memória fotográfica me leva à minha mãe pondo o leite quente na aveia já cozida e mexendo para misturar bem. Exatamente como eu estava fazendo nesse dia 21 de março de 2018.  O movimento da colher rodando no mingau foi o gatilho que detonou toda essa lembrança, quase 80 anos depois.
Junto com essa lembrança específica muitas outras   foram resgatadas, mas isso é uma outra história que já deve ter sido contada.  Ou fica para outra vez.
Escrito em letra cursiva, de maneira   compulsiva e terminado em 22:15h do dia 21 de março de 2018 e digitado (pouco editado) em 28 de março de 2018 às 18:45h  RECUPERADO EM 05 DE ABRIL DE 2019 - Guardado junto o original
·          Congoleumespécie de tapete de materiais minerais ou sintéticos com grande durabilidade.  Moda nas décadas de 30 – 40
·         Percevejos - Os Cimicidae são insetos popularmente conhecidos como percevejos de cama. Os percevejos eram muito comuns em diversas partes do mundo até o final da década de quarenta. Durante as décadas de 50 e 60, devido ao uso de inseticidas de efeito residual como o DDT e BHC, além da melhor higiene doméstica, como trocar e lavar roupas de cama e varrer a casa, esses insetos tornaram-se raros. Hoje em dia, em vista de ter aparecido a resistência, o aumento da densidade populacional nas periferias das cidades e das baixas condições sociais, está ocorrendo um novo surto de percevejos em numerosas cidades brasileiras. Este surto está acontecendo principalmente em favelas, acampamentos de operários de grandes obras civis e nos quartéis, locais onde há uma maior densidade de pessoas. É necessário o reestudo dos hábitos e da ecologia dos percevejos para seu controle. Sua importância médica está relacionada diretamente com a espoliação sanguínea e a interrupção do repouso noturno de nós humanos.
Bisotado ou Bisotê    - é um acabamento onde as bordas são trabalhadas e chanfradas em angulação. Essas bordas podem ser feitas com um ou dois centímetros, para dar leveza e criar uma moldura delicada ao seu espelho ou vidros.





Comentários

Congoleum: rígido, duro, quebradiço e cheirava mal. Mas era o que se tinha na época. Na minha casa, quando tinha lá meus 10 anos, tinha uma passadeira deste material.
Hilda Araújo disse…
Em casa quando era criança tínhamos um tapete de linóleo, que também é um material quebradiço e era decorado com motivos florais ou geométricos como um tapete de tecido. Ele era lavável e encerado como o chão de madeira corrida.

Livia disse…
Delícia o mingau de aveia, gosto muito também.
Vou experimentar adicionar a baunilha. Parece-
me boa dica.
Renata Turbiani disse…
Vovô Neuza, bom dia. Quero fazer uma entrevista com a senhora para uma revista que escrevo. Pode me passar seu contato, por favor? Meu e-mail é editoralamonica.renata@gmail.com. Obrigada. Abraço
Melhor contato é com meu e-mail vovoneuza@gmail.com
Luciano FF disse…
Olá D. Neuza! Que alegria ler sobre suas memorias. Estou escrevendo a biografia do Brig. Roberto Brandini, que estudou no Gr. Esc. Sacoma em 1930-34. A senhora ainda teia fotos ou poderia descreve esta Escola, naquela época? Obrigado.

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