O MANDACARU DA CASA DAS ROSAS - uma história dentro da história da Casa


Avenida Paulista nº 37 - Casa das Rosas
Tem sua história contada e recontada. Tem sido visitada e revisitada.

Casa das Rosas recém-terminada, em 1935

Residência familiar até 1986, tombada pelo Condephaat em 1985 foi salva da demolição pela “lei 9.725 de Transferência de Potencial Construtivo de Imóveis Preservados, aprovada pela Câmara Municipal em 1984, que dá ao proprietário do bem tombado o direito de vender as áreas não construídas do terreno, desde que o novo proprietário assuma os custos de preservação das edificações de valor histórico.“  - 0 Jardim das Resistências –pag 80.

 Vista aérea da Casa das Rosas logo depois do tombamento


Casa das Rosas e Edifício Parque Cultural Paulista – final de 1980

Desapropriada pelo Governo do Estado quando seu restauro e o Parque Cultural Paulista ficaram prontos em 1991, a Casa transformou-se em uma Galeria Estadual de Arte, função essa que durou até 2003 e passou por várias gestões.
 Em 1995 durante o governo de Mario Covas, o pintor, videomaker, performer, escultor, escritor, músico e curador José Roberto Aguilar foi convidado para dirigiu a Casa das Rosas. Durante sua gestão o número de produções foi grande.
Entre outras coisas, no segundo semestre de 2000 produziu a mostra “Rosas Rosa – Emblemas e Movimentos com a obra Grande Sertão: veredas de João Guimarães Rosa interpretada por nove artistas plásticos e nove videomakers.

E entra aqui a história do Mandacaru da Casa das Rosas, presente desde então, nunca percebido, nem comentado nas várias vezes em que se falou da Casa.
Recuperada a história através de minha amiga Esther Martirani, pedi-lhe um texto, ela escreveu. Com autorização de Esther e de seu filho Ricardo Pichi Martirani eu reproduzo o texto na íntegra.

 A odisseia do mandacaru da Casa das Rosas
Para a exposição “Rosas Rosa – Emblemas e Movimento” sobre o escritor mineiro João Guimarães Rosa, organizada pela Secretaria de Estado da Cultura e realizada no anexo Casa das Rosas no ano 2000 foi solicitada uma participação ao vídeo-artista Ricardo Pichi Martirani que se decidiu por uma vídeo-instalação. Num arroubo poético, resolveu dar à mesma um titulo com verso alexandrino: “Riobaldo Guimarães Diadorim das Rosas”.

Para essa criação, segundo seu relato, Pichi Martirani se inspirou em um trecho de “Grande Sertão Veredas”, que tinha lido recentemente, onde Riobaldo se dirige à Diadorim que se colocara, num ímpeto, como candidato a líder do grupo de jagunços, porque o anterior tinha morrido, e fala, olhando para ele: “Eh! Mandacaru! Oi, Diadorim belo e feroz!” e Guimarães Rosa continua: “Em jagunço com jagunço, o poder seco da pessoa é que vale...”

Pichi Martirani lembrou-se que, em viagem que fizera a São Raimundo Nonato, no Piauí, fotografara esse esplendido cactus, com flores e frutos e não só espinhos.
Imediatamente lhe veio à mente a inspiração de trazer um exemplar de mandacaru para usá-lo como símbolo do sertão e metáfora de Diadorim.
Diadorim revelava diante do grupo completa aparência de masculinidade. Tal qual o cactos, por sobreviver na seca, demonstrando a resistência e a força do agreste e, por ter espinho, revelando a capacidade de se defender, Diadorim sempre evidencia determinação em suas atitudes. No entanto, a planta, por ser capaz de produzir flores e frutos, apresenta também características femininas. Guimarães Rosa, com a comparação de Riobaldo, parece já embutir a revelação final da feminilidade de Diadorim.
Desse modo, o mandacaru se torna símbolo responsável pela gestação da personalidade de Diadorim e, por extensão da fala de Riobaldo em Grande Sertão Veredas.

Para sua vídeo-instalação, Pichi Martirani pesquisou regiões do sertão e decidiu-se por buscar um mandacaru na cidade de Vitória da Conquista, na Bahia, por ter a região as mesmas características do Sertão de Guimarães.

Filmou o local, pediu licença ao IBAMA para transportar um grande e viçoso espécime para São Paulo, organizou toda a viagem, comandou o aventuroso trajeto pelas ruas da cidade, cuidando para que a planta, pela sua altura, não sofresse nenhum dano ao passar por túnel,   plantou-a em um vaso grande que colocou na sala do andar superior da Casa das Rosas. Ligou-o por meio de uma mangueira, símbolo de cordão umbilical, a um aparelho de televisão, enterrado dentro de uma caixa de vidro, para dar à luz imagens sugeridas pelo texto de Guimarães Rosa.
Esse mandacaru foi depois transplantado para o jardim da Casa das Rosas, com uma placa:

MANDACARU – UMA OBRA DE ARTE
RICARDO PICHI MARTIRANI

placa essa que desapareceu. De acordo com um comentário do multiartista José Roberto Aguilar, foi “o sertão plantado num jardim francês”.

Os espinhos do mandacaru são considerados de vital importância no sertão por ter a função de proteção e de captação de água. Curiosamente, desapareceram no ambiente úmido de São Paulo...

Esther Alves Martirani



Mandacaru  de 2000 em detalhe ainda dá para vislumbrar a placa.


Com o resgate da história do Mandacarú,  voltei à Casa das Rosas e fotografei-o neste março de 2014.
Ele cresceu, e está vivo e forte, mas não tem nenhuma identificação.


Mandacarú na Casa das Rosas em março de 2014 (já ultrapassa o terraço de cima)



 Outras imagens do mandacaru em 2014


JÁ ESTÁ NA HORA DE IDENTIFICAR O MANDACARÚ E CONTAR TODA SUA HISTÓRIA

Informe botânico: MANDACARU (Cereus jamacaru), também conhecido como cardeiro,  é uma planta da família das cactáceas. É comum no nordeste brasileiro e não raro, atinge até mais de 5 metros de altura.
Existe uma variedade sem espinhos, usada na alimentação de animais. A variedade comum é altamente espinhenta e também é usada na alimentação de animais, quando seus espinhos são queimados ou cortados. O mandacaru resiste a secas, mesmo das mais fortes.
As flores desta espécie de cactos são brancas, muito bonitas e medem aproximadamente 30 cm de comprimento. Os botões das flores geralmente aparecem no meio da primavera e cada flor dura apenas um período noturno, ou seja, desabrocham ao anoitecer e ao amanhecer já começam a murchar. Seu fruto tem uma cor violeta forte. A polpa é branca com sementes pretas minúsculas, e é muito saborosa, servindo de alimento para diversas aves típicas da caatinga, como a gralha-cancã e o periquito-da-caatinga.

Texto montado por Neuza Guerreiro de Carvalho com a colaboração e autorização  de Esther Alves Martirani e  Ricardo Picchi Martirani.  Março de 2014




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